quarta-feira, 29 de outubro de 2014
Oxente. União de desiguais? Aonde!
Nada como uma eleição acirrada para as pessoas revelarem o que, realmente, pensam do seu País e dos "seus irmãos", todos convivendo num mesmo espaço territorial marcado pela diversidade cultural, mas também pelas desigualdades regionais e sociais.
No espaço do Facebook podemos observar extratos do pensamento da nossa sociedade. Vimos, por exemplo, como artistas e esportistas que tanto gostamos revelaram-se pessoas preconceituosas, especialmente contra os nordestinos. Além deles, sentimos o mesmo de pessoas que moram no Sul e no Sudeste do Brasil.
Uma coisa que se falou muito após o resultado das eleições foi que o Brasil saiu divido com a vitória de Dilma. Se fosse Aécio, seria uma vitória suada em uma disputa dramática, mas salutar para a democracia. Disse-se ainda que o grande desafio seria buscar a união do País. É claro que unir diferenças ajudará muito a evolução da própria sociedade. Mas, só se essa diversidade cultural for respeitada e aproveitada por todos na perspectiva de um mundo melhor. Além disso, as desigualdades regionais e sociais precisam ser eliminadas.
O problema é que a união que defendem se daria com a manutenção dessas desigualdades. Certamente, ricos querem um país unido com pessoas pobres que aceitam trabalhar em suas casas ou em suas fazendas sem carteira assinada e com menos de um salário mínimo. Hoje, as pessoas barganham melhor a valorização de sua mão de obra. Podem comprar muitas coisas e fazer tantas outras que antes não podiam. Isso tem irritado muitas dessas pessoas que destilaram seu ódio contra os nordestinos nas redes sociais.
Por séculos, quem governou o Brasil concentrou polos de desenvolvimento industrial nas regiões Sul e Sudeste, sem se preocupar com as outras partes do País. Isso, sim, dividiu a nação entre alguns que se acham superiores e outros, que nunca se acharam menores, mas foram sempre rotulados de inferiores.
Essa união baseada na manutenção das desigualdades, proposta pelas elites através dos grandes meios de comunicação, é falsa e hipócrita. União consistente e sincera é a realizada com pessoas no mesmo patamar econômico, em pé de igualdade. Assim, a diversidade sociocultural se torna o grande patrimônio de uma nova e melhor nação.
Um governo novo, que propõe ideias novas, deve radicalizar políticas de investimentos nas regiões que ainda precisam. Caso contrário, união nacional num país de preconceituosos e desiguais? Aonde!
segunda-feira, 27 de outubro de 2014
Quem tá no comando dá o tom para um novo governo e ideias novas
Depois do susto, reflexo da disputa acirrada, a presidenta Dilma e todos os que apoiam esse projeto em curso comemoraram a vitória. Ao observar o endurecimento da batalha e a voz da sociedade, a campanha da petista lançou o conceito “Governo novo, ideias novas”, combinado com propostas que vão ao encontro dos anseios de mudanças que a população deseja, simbolizadas nos temas reforma política e combate à corrupção.
O desafio será grande no segundo mandato da presidente Dilma. PT e aliados (PMDB, PCdoB, PDT, PR, PRB, PROS, PP e PSD) conquistaram 304 cadeiras contra 209 da oposição na Câmara dos Deputados, e 53 lugares no Senado, ante 28 dos oposicionistas. Além disso, 19 dos 27 governadores são da base aliada. Em termos de números, maioria assegurada.
Mas, duas questões importantes. Primeiro, maioria nem sempre resulta em governabilidade. Muito menos, tranquila. Quem acompanha a relação entre Executivo e Congresso observa que, em muitos momentos, para garantir a governabilidade, faz-se concessões absurdas com o objetivo de ter o apoio dos parlamentares em votações importantes para o governo. Segundo, as primeiras análises mostram um perfil mais conservador do Congresso Nacional. Isso exigirá que Dilma e a linha de frente de deputados próximos a ela tenham firmeza e capacidade para garantir a unidade dos aliados nos momentos cruciais.
MOBILIZAR E POLARIZAR A SOCIEDADE
Conduzir o processo para fazer reforma política, implantar medidas duras de combate à corrupção e avançar em questões como a democratização dos meios de comunicação, por exemplo, exigirá muito nessa nova etapa para Dilma materializar as ideias novas que apontam um novo ciclo de desenvolvimento do País.
Entendo que um governo quando está em dificuldades para transformar maioria em governabilidade, sem concessões lamentáveis, e aprovar as medidas avançadas, é preciso construir essa maioria também na sociedade. Por isso, Dilma deve fortalecer mecanismos de participação social nessa nova empreitada (como o plebiscito e as conferências) e valorizar os movimentos sociais organizados, como sindicatos, entidades de mulheres, de jovens, evangélicos progressistas, da luta antirracista, da luta ambiental, entre outros.
Não dá para assistir a sociedade ficar polarizada apenas no período das eleições. Quem está no comando dá o tom, aponta o caminho, dita o ritmo e conclama os coletivos sociais a ajudarem na construção do novo governo e das ideias novas. Um governo que surgiu das lutas populares precisa mobilizar e polarizar a população em torno das bandeiras que vão garantir os avanços que a sociedade tanto deseja e precisa.
quinta-feira, 28 de agosto de 2014
POR QUE ELES TÊM MEDO?
Nada mais oportuno do que a disputa eleitoral para pautar alguns temas importantes da sociedade, mesmo que ela não tenha consciência disso. Os meios de comunicação, por exemplo, parecem que são assunto apenas de quem estuda o setor ou trabalha nele. É através da internet, do rádio, da TV, dos jornais, entre outros meios, que as pessoas dão visibilidade aos seus anseios. Há quem diga que o que não é visto na mídia não existe e não é verdade. Em uma sociedade tão marcada pela informação, quase tudo que acontece passa pelos meios de comunicação.
É um tema que foi transformado em tabu e precisa ser tratado, até para o próprio desenvolvimento da humanidade. Afinal, informação é o bem mais preciso dos dias atuais. É a partir dela que construímos o conhecimento sobre algo e fazemos escolhas. É estranho ver que nenhum dos candidatos a presidente aborda o assunto. A democratização da mídia se tornou uma necessidade.
MUITO PARA POUCOS
Imagine que no Brasil quatro empresas – familiares – controlam 90% da informação que as pessoas consomem. É muito poder para pouca gente. Para se ter uma ideia, o site Donos da Mídia mostra que a Globo possuiu 340 veículos de comunicação: 105 emissoras de TVs; 17 Canais TVA; 76 emissoras de rádio FM, 11 OC (ondas curtas), 52 OM (ondas médias), 4 OT (ondas tropicais), 9 TVC (TV a Cabo), 2 MMDS (Serviço de Distribuição de Sinais Multiponto Multicanal), 1 DTH (Direct To Home – via satélite), 2 TVA (Serviço Especial de Televisão). Além de 33 jornais impressos, 27 revistas e 1 Radicom (comunitária).
Em seguida, vem o SBT, com 195, sendo 58 emissoras de TVs; 70 emissoras de rádio FM, 1 OC, 39 OM, 2 OT, 1 TVC, 10 MMDS, 1 DTH. Além de 12 jornais impressos e 1 Radicom.
Depois está Band, com 166 veículos: 39 emissoras de TVs; 2 Canais TVA; 48 emissoras de rádio FM, 5 OC, 44 OM, 3 OT, 13 TVC, 1 MMDS. Além de 11 jornais impressos.
Por último, aparece a Record, com 142 veículos, sendo 46 emissoras de TVs; 51 emissoras de rádio FM, 2 OC, 31 OM, 3 OT. Além de 9 jornais impressos.
A única empresa pública, a EBC, possui 95 veículos: 18 emissoras de TVs; 32 emissoras de rádio FM, 10 OC, 27 OM, 7 OT e apenas 1 jornal impresso.
AVANÇOS, PERO NO MUCHO
É verdade que a partir do governo Lula avançamos com a as conferências de comunicação em todo o país. Contudo, muitas decisões não foram implementadas, por pressão dessas empresas, que acreditam que essas medidas vão ferir a liberdade de imprensa e a Constituição Federal. Um argumento apenas para justificar o monopólio desse poder em suas mãos.
Democratizar os meios de comunicação é assegurar o acesso da sociedade à informação, à notícia de qualidade e à diversidade cultural do país. É garantir que os meios de comunicação sejam um bem público, pois são concessões públicas.
Enquanto isso, países aqui pertinho - Argentina, Uruguai e Equador - fizeram mudanças recentes importantes, graças à mobilização das suas sociedades e a vontade política de governos mais ligados ao povo. Os argentinos conseguiram que entidades sem fim lucrativo fossem concessionárias de emissoras de rádio e televisão, quebrando a hegemonia do grupo Clarín (a Globo de lá). Lá, 33% das concessões são para sindicatos, universidades, cooperativas, igrejas, entre outras organizações.
No Uruguai, a lei determina que é dever do Estado assegurar o acesso universal aos meios, contribuindo com liberdade de informação, inclusão social, não-discriminação, promoção da diversidade cultural, educação e entretenimento. Além disso, exige transparência no processo de concessão de autorizações e licenças para exercer a titularidade. Cria o Conselho de Comunicação Audiovisual para propor, implementar, monitorar e fiscalizar o comprimento das políticas. Por fim, estabelece cotas mínimas de produção audiovisual nacional.
Já no Equador, a concessão e a distribuição de frequências de rádio e televisão aberta passaram a ser equilibradas: 33% para meios públicos, 33% para meios privados e 34% para meios comunitários. Quem descumprir ou se desviar dos fins para os quais foram concedidas, elas serão devolvidas ao Estado e redistribuídas à sociedade.
DESAFIOS
O primeiro grande desafio do novo governo que assumirá em 2015 é acabar o absurdo de 26 anos da Constituição de 1988 sem regulamentar o capítulo da Comunicação Social. É fazer o direito à comunicação ser um direito humano. É garantir mais produções locais, educativas e independentes. É assegurar a nossa identidade nacional, rica pela diversidade regional.
Isso nos trará ainda mais benefícios, pois mexerá com formação profissional, mercado de trabalho, economia e geração de emprego. Um governo compromissado com essa questão atua para mostrar isso a sua população e para dar força aos conselhos de comunicação. Eles garantem a participação social nas discussões e construção dos planos estaduais e nacional de comunicação. O novo governo deve fortalecer rádios e tevês comunitárias, além de outros meios alternativos usados pela população.
Com a mobilização social, o governo Dilma sancionou, em abril deste ano, a Lei 12.965/14 (Marco Civil da Internet), que estabelece direitos e deveres para usuários e provedores de serviços de conexão e aplicativos na internet. Não foi o que o movimento social desejou, mas avançou. No entanto, ainda é muito pouco para um país com a importância do Brasil na atualidade.
É essencial aprofundar as políticas públicas para garantir o acesso das camadas populares e de regiões distantes a bons serviços. É urgente consolidar um sistema público de rádio e televisão para impedir o abuso do poder econômico, bem como democratizar a distribuição das verbas públicas de publicidade.
No mundo das convergências tecnológicas é fundamental garantir a convergência da informação e do conhecimento. Com a democratização dos meios de comunicação isso será mais fácil. Mas, por que eles têm medo? Chegou a hora de enfrentá-lo.
Cláudio Mota – jornalista, publicitário e responsável pelo Axé com Dendê
sexta-feira, 28 de março de 2014
Mulheres procuram se achar, mas não se encontram
Digam o que quiserem,
mas as datas são importantes para reflexões e até mudanças de atitude. São boas
as manifestações de carinho às mulheres no Dia Internacional da Mulher, mas
mudança e transformação acontecem, especialmente, a partir do movimento e da
sinergia produzidos por conflitos de ideias. É inquietante ver que, há algum
tempo, as comemorações dessa data estão perdendo força e se limitando a alguns debates
fechados e caminhadas cada vez com menos mulheres.
Vi isso
na Marcha das Mulheres em Salvador, no dia 17. Observei uma certa mesmice. Uma
obrigação que se deve cumprir para honrar as 130 operárias têxteis da fábrica Cotton, em Nova
Iorque, que fizeram uma greve nesse dia, em 1857. Elas ocuparam a empresa para reivindicar
redução da jornada de trabalho, equiparação salarial com os homens e tratamento
digno no local de trabalho. Foram trancadas dentro da fábrica, que foi
incendiada.
Questão
de foco
No mundo atual, as
pessoas são bombardeadas por milhões de informações a todo momento. Fica
difícil captar o que é essencial em meio à dispersão de ideias, problemas e
perspectivas. As comemorações do Dia Internacional da Mulher deixaram de ser
exclusivamente no dia 8 de Março para terem várias atividades durante o mês, no
que se chama de Março Mulher. Aqui, ao meu ver, começa o problema atual para
que a luta feminina dê resultados mais concretos para as mulheres. Falta foco,
que garante concentração de energia, atenção e esforço para realizar algo
importante em um determinado momento. Quando se amplia, há dispersão de
energia, esforço e atenção.
Aquilo que é uma
vantagem da alma feminina – a capacidade de lidar com várias situações ao mesmo
tempo – choca-se com o que a realidade pede: foco. Poderá contribuir com as
lutas femininas se as mulheres definirem esse foco e colocarem essa vantagem ao
seu favor.
Mulheres procuram se achar, mas não se encontram porque a
luta feminista está diluída nas lutas gerais da sociedade. Bandeiras
específicas e importantes se condicionam às bandeiras maiores. Não há nada que consiga catalisar o sentimento geral das mulheres.
Também entendo que dia
da mulher é todo dia, mas marcar a data é essencial para canalizar as atenções
da sociedade sobre o que ainda precisa mudar para garantir a tão sonhada,
buscada e batalhada emancipação feminina, política, econômica, emocional e cultural. Esse ano, em Salvador, por
cair num sábado e logo após o Carnaval, resolveu-se colocar o grande ato, a
Marcha das Mulheres, para o dia 17. Ganhou-se mais tempo para preparar e
mobilizar as mulheres. Mas, não aconteceu. Se houvesse foco e um forte chamado,
pelo qual mulheres que não são militantes participassem , poderia ter se
construído o ato, antes ou depois da folia, que seria grandioso.
Muitas
bandeiras
Procurei nos principais
sites que abordam questões e lutas femininas para ver quais as bandeiras para
esse ano. Na organização mais avançada, a UBM (União Brasileira de Mulheres),
constatei nove palavras de ordem: 1) mais poder político para as mulheres; 2) contra
toda forma de escravidão e pela autodeterminação dos povos em todo o mundo; 3) não
às guerras; 4) por uma América Latina altiva, unida, diversa e soberana; 5) um
Brasil democrático, grande potência econômica, energética, alimentar,
científica; 6) igualdade de direitos e na remuneração do trabalho; 7) reforma
política; 8) combate à violência; 9) respeito ao meio ambiente; 10) defesa do
SUS.
Tudo com o objetivo de
superar a opressão patriarcal e a exploração feminina. Ufa!
Ficaria mais fácil se não
limitar o tratamento, com mais ênfase, dos assuntos de interesse da mulher
apenas em março. Focar em três eixos pode significar colocar mais energia nessa
luta.
Ao meu ver, o primeiro seria MAIS
PODER. Afinal, trata-se de 51,2% da população brasileira e 54,2% do
eleitorado (eleições de 2012), mas apenas 10% de parlamentares no Congresso
Nacional, mesmo com uma mulher na Presidência. Campanhas e ações junto à
sociedade, partidos, organizações sociais e Judiciário seriam potencializadas.
O segundo é o COMBATE À VIOLÊNCIA. O
centro está no aprimoramento da importante Lei Maria da Penha. Não dá para filosofar.
As mulheres precisam de políticas públicas: mais centros de referência, casas de
abrigo, delegacias e varas especializadas no tema. É ir pra cima de governos e
prefeituras para exigir e garantir isso.
Por fim, a IGUALDADE. Começa pela redução
da jornada de trabalho, sem redução de salário. Não haverá emancipação da
mulher com tripla jornada (trabalho, estudo, família). Não adianta falar em
redução geral nesse caso. Se acontecer, o problema da mulher continuará e apenas
diminuirá de tempo. É diferente do homem. Depois, lutar pela aprovação do Projeto de Lei nº 6.653/09, da deputada federal Alice
Portugal. Ele equilibra as
responsabilidades familiares e profissionais, ampliando a rede de
assistência a crianças e idosos para garantir o desenvolvimento da mulher na
carreira. Mexe com as empresas ao criar um selo de reconhecimento para as que
adotarem planos de igualdade salarial e de oportunidades de crescimento na
carreira para mulheres e homens, entre outras coisas. E creches públicas para que possam deixar seus filhos bem e ir
trabalhar com tranquilidade. Também não dá para filosofar. O governo Dilma
destinou 138 creches para Salvador, mas o ex-prefeito só fez
11 e o atual, nada.
Cláudio Mota - Jornalista, publicitário e responsável pelo Axé com Dendê
quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014
Davi contra Golias na era da internet
Aero ameaça gigantes da TV aberta
Por Roberto Amado, postado no blog Diário do Centro do Mundo
A internet ameaça cada vez mais as TVs abertas. O novo sinal disso é uma
pequena empresa sediada em Nova York chamada Aero. O seu criador é o indiano
Chet Kanojia, que desenvolveu um sistema capaz de captar os sinais das
transmissões das TVs abertas e disponibilizar aos seus clientes. Por 8 dólares
mensais, os usuários podem assistir e gravar qualquer programa em qualquer
equipamento conectado, como smartphones, tablets e notebooks, de qualquer
emissora aberta, grande ou pequena.
Kanojia começou a operar a sua empresa no começo do 2012 apenas em Nova
York, mas já expandiu para outras cidades, como Atlanta e Boston. Imediatamente
a American Broadcasting Companies, entidade que reúne interesses das emissoras
abertas norte-americanas, percebeu o perigo e entrou com uma representação na
Suprema Corte. Agora, em janeiro, a representação foi aceita, provocando uma
grande expectativa no mercado. As emissoras, como as três gigantes ABC, NBC e
CBS, alegam que o sistema da Aero é um roubo de conteúdo e que fere os princípios
dos direitos autorais.
Mas o problema é muito maior. As grandes emissoras, que produzem
programas e noticiários, faturam 4 bilhões de dólares por ano em taxas de
retransmissão cobradas das centenas de TVs a cabo que existem no país. Com o
sistema da Aero, esse mercado tende a perder forças, já que o conteúdo da
internet é disponível e pode ser gravado.
A questão é tão grave que, caso percam a ação, algumas emissoras, como a
CBS e a Fox, já anunciaram a intenção de abandonar as transmissões abertas e
passarem a opera apenas TV a cabo.
A verdade é que o sistema de Kanojia é tão simples quanto
“revolucionário”. Simples porque basta apenas uma diminuta antena, que cabe na
palma da mão, para ter acesso a tudo que é transmitido abertamente. E revolucionário,
porque subverte o esquema clássico de poltrona-tv que alimentou as grandes
emissoras por décadas a fio. Em outras palavras, é a plena tradução da
eficiência mediática da internet.
A Aero está se defendendo sob o argumento de que apenas está fazendo
aquilo que a lei das TVs prega: televisão gratuita acessada por transmissões
aéreas.
“Essa é a primeira batalha de uma guerra que vai durar 50 anos e
questionará a relação da internet com as TVs e o público”, disse Kanojia em
entrevista ao New York Times. “Se a Suprema Corte aceitar a ilegalidade da
Aero, irá contra uma inovação que é inevitável nas próximas décadas ou anos”. O
indiano, tido como um pesquisador brilhante, garante que seu interesse é
promover a democratização e portabilidade da TV, ainda que reconheça o valor de
um mercado de 57 milhões de pessoas que ainda usam a antena para assistir à
programação televisiva.
De fato, dinheiro não parece ser o problema de Kanojia: em 2008 ele
vendeu para a Microsoft, por 250 milhões de dólares, um aplicativo que permite
às empresas de TV a cabo interagir com seus assinantes.
A introdução do sistema de Kanojia pode ser um marco para uma realidade
que está apenas começando a ser desenhada: a de que as novas tecnologias
agregadas à internet substituirão de maneira implacável o velho modelo das
comunicações, no mar, no céu ou na terra.
sexta-feira, 24 de janeiro de 2014
“Rolezinho”: Para quem gosta de ser diferente, mas não desigual
Nada melhor do que retomar
o Axé com Dendê dando um ‘rolé’ pela polêmica que esse novo fenômeno está
produzindo. Tirando a presunção do Fantástico, exibido no dia 19, de ter
encontrado os criadores do “rolezinho”: Juan, de 16 anos, Yasmim, de 15 e
Renatinho, 15, o fato é que estamos diante de uma nova forma de ação - e reação
- de jovens das periferias brasileiras.
Segundo a reportagem, os
três ficaram famosos na internet. Juan tem 56 mil seguidores, depois que
começou a postar vídeos na web. Yasmim possuiu 84 mil seguidores e o mc Renatinho
contabiliza 16 mil fãs. Assim, resolveram marcar encontros com os fãs nos
shoppings, muito para tirar fotos e trocar ideias. Mas, o primeiro “rolezinho”
aconteceu no dia 7 de dezembro, no shopping de Itaquera, em São Paulo, envolveu
6 mil pessoas e gerou grande confusão.
Querer identificar a
origem de algo nos dias atuais ficou mais difícil, pois vivenciamos, segundo os
filósofos franceses Gilles Deleuze e Félix Guattari, a era do Rizoma, onde fenômenos
surgem e se espalham, sem uma origem precisa. É como algumas plantas, onde brotos
se ramificam em qualquer ponto.
Para Deleuze e Guattari, o conhecimento está se
elaborando simultaneamente, a partir de todos os pontos e sob a influência de
diferentes observações e conceitualizações, onde não há raízes e nem linhas de
subordinação hierárquica. O Rizoma é um mapa, mas sempre desmontável,
conectável, reversível, modificável, com múltiplas entradas e saídas, e suas
linhas de fuga.
QUESTÃO DE CLASSE
Na verdade, o
“rolezinho” pegou de surpresa a todos e ficou maior do que um simples encontro de
pessoas no shopping. Logo veio a reação dos shoppings, com ações na Justiça
para proibir a prática.
Outra questão
interessante é ver que o Brasil presencia uma nova classe média, fruto da
melhoria da renda e do emprego nos últimos 12 anos. Mais pessoas passaram a ter
acesso a coisas que antes eram restritas a poucos. Mas, muitas ainda continuam
sendo isoladas em guetos impostos pela sociedade. Trata-se de algo em evolução,
gerando novos comportamentos sociais.
Podemos refletir o
“rolezinho” tentando entender alguns símbolos da nossa sociedade, como os shoppings,
que pularam de 280 em 2000 para 495 em 2014. São considerados templos de
consumo, lazer e encontros. Foram construídos para as elites consumirem com
conforto, comodidade e segurança. É pra gente diferente, status estimulado pela
propaganda.
Hoje, já vemos bairros
inteiros construídos com shoppings, centro empresarial, clube, escola. As
elites vão se fechando para se proteger dos (des)iguais”. Mas, esqueceram que
os jovens da periferia também querem – e têm direito – frequentar nobres espaços,
antes exclusivos das classes média e alta.
O “rolezinho” é a reação
de quem existe, mas não é visto pela sociedade e quer ir além dos limites
impostos por pessoas que se acham mais cidadãs.
O consumo estimulado
pela propaganda revela também outras facetas desses conflitos na sociedade.
Primeiro, a felicidade e a realização pessoal pelo consumo, propaladas pela
publicidade, não chegam para todos, gerando frustrações e reações. Não obtendo
produtos de marca que dão status a quem está na base da pirâmide social, a
reação é confrontar, pelo menos indo aos shoppings para “tirar onda” com “mauricinhos”
e “patricinhas”.
O NOVO VELHO
Esse novo fenômeno é
mais uma manifestação dos conflitos de classes em nossa sociedade, como
observaram, no século 19, os filósofos alemães Karl Marx e Friedrich Engels: “A
história de toda a sociedade que existiu até agora é a história da luta de
classes”. Seus protagonistas são, de um lado, quem tem os meios de produção da
riqueza e, de outro, os que vivem do trabalho (as vezes, sem trabalho).
De acordo com Marx e
Engels, os conflitos da sociedade de consumo (capitalista) assumem
multiplicidades de formas e expressões, mas situam-se sempre em duas bases: De
um lado, as elites, que procuram defender, manter e fortalecer a ordem social. Do
outro, a classe subordinada, em permanente pressão de baixo para cima, tentando
sempre melhorar suas condições de vida.
Para Marx, transformações
sociais ocorrem na medida em que as contradições que se manifestam na
sociedade, produzindo determinadas formas de consciência, e os homens agem para
modificar a realidade.
Assim, o Renatinho
cantou ao final da reportagem do Fantástico: “Não somos bandidos ruins nem
menor infrator. Somos apenas a praga que o sistema criou”. O “rolezinho” é uma
reação de pessoas que também gostam de ser diferentes, mas não aceitam ser
tratadas como desiguais.
Cláudio Mota - Jornalista, publicitário e responsável pelo Axé com Dendê
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